segunda-feira, 19 de março de 2007

Consciência, genes e nada sobrenatural

Escrito em: 19/03/2007. 
Revisado em 19/08/2022. 


O cérebro humano é uma máquina físico-química com aproximadamente cem bilhões de neurônios. Toda essa maquinaria, junto com outros tipos de células, é responsável pelos nossos pensamentos, imaginação, abstrações, sentimentos, emoções, etc., e, também,  nosso caráter e personalidade. 

Tudo isso são, provavelmente, em sua maioria, propriedades emergentes das reações físico-químicas, ou seja, propriedades situando-se em níveis superiores dessas reações, mas dependentes destas. 

Uma pergunta difícil de ser respondida é aquela na qual se questiona se podemos entender, na totalidade, o funcionamento dessa maquinaria. Não precisaríamos de uma mente superior para entendermos uma inferior? Podemos criar circuitos neurais e aproximá-los em propriedades da nossa forma de pensar e sentir? Talvez não mas pode ser uma questão em aberto.

Outra questão sempre me intrigou com relação às nossas mentes: a consciência; uma propriedade das mais complexas, talvez a maior dos nossos cérebros. É a capacidade de um sistema voltar a si mesmo, corrigir erros, analisar as suas verdades e afirmações, etc. O único sistema assim conhecido é o cérebro humano* produzindo a consciência e, ao voltar sobre si mesma, tendo consciência dela própria, é a propriedade mais intrigante que podemos imaginar: a autoconsciência. 

Nenhuma lei científica ou um conjunto delas conseguem explicar essa façanha e assim seria fácil para animistas ou criacionistas dizerem de algo sobrenatural guiando nossas mentes ao gerar a consciência. 

Não é bem assim. Apesar de não termos leis matemáticas ou biológicas elucidando essa questão neural, temos um recurso, uma pista, a nos apoiar: nossos genes. 

Eles são os agentes de construção de todo nosso corpo incluindo o cérebro. Tudo funciona como funciona porque nossa estrutura, construída com base nos genes, é do jeito que é. 

Então o cérebro é um sistema possuindo propriedades, realizando as mais diversas funções, devido a sua estrutura construída de acordo com os nossos genes. 

Não importa no momento o quanto compreenderemos as propriedades cerebrais, e se com as leis científicas ou com a codificação dos genes. Importa é saber que nada vem de algo sobrenatural. 

A consciência, talvez a mais complexa propriedade cerebral, vem de uma estrutura, o cérebro, construído por agentes determinados pelo nosso DNA:  nossos genes. Tudo matéria e energia conhecidas por nós e seria um absurdo pensar que o cérebro seria construído para funcionar com uma alma.


Nota:
(*) António Damásio, neurocientista português naturalizado estadunidense, diz em seu livro “O mistério da consciência” (2000), que os outros mamíferos também possuem consciência, mas por instantes.

Egoísmo versus Altruísmo: só o homem poderá salvar o próprio homem

Escrito em: 19/03/2007. 
Revisado em: 08/10/2018. 

Palavras-chave: Altruísmo, Egoísmo, Religião, Salvação. 
  

Cena comum em cidades no mundo inteiro: um mendigo enfermo sentado em uma calçada pede uma esmola a alguém. Existem vários tipos de pessoas e podemos obter algumas conclusões de um episódio desse. 

Uma passa pelo mendigo, não dá nada, não possui nenhum sentimento humanitário, solidário. Outra dá algum dinheiro porque tem pena daquela pobre criatura. Outra mesmo com pena não cede. Enfim é uma situação nada simples e se poderia falar em dezenas de reações dos pedestres. 

Mas um fato eu afirmo categoricamente: muitas, mas muitas pessoas sentem, lá no fundo, um certo peso na consciência. Elas são a única salvação do enfermo, mas não se mobilizam para salvá-lo, nem a outro. Não entram para alguma associação de caridade, não se envolvem. Claro que não, o egoísmo é poderoso. Poucas praticam o altruísmo. 

Muitas rezam pelo próximo em suas igrejas ou mesmo sozinhas em casa, pelos cuidados de Deus. Ficam aliviadas, extraem o peso de suas consciências porque delegam a um ente abstrato uma responsabilidade só sua. Unicamente sua. Fácil não?!
  
Por natureza somos e vivemos entre dois polos: o egoísmo e o altruísmo. Estaríamos extintos se fôssemos 100% só um deles. Só egoístas não formaríamos sociedades, famílias. Só altruístas esqueceríamos de nós mesmos por completo. Nem conseguimos pensar direito como seríamos totalmente. 

Onde quero chegar? Bem, sou otimista quanto ao nosso futuro como espécie animal. 
Milhares de anos de cultos, seitas e religiões e o homem não aprendeu muito a respeito de solidariedade, humanidade e altruísmo. Continuamos nos matando e explorando uns aos outros. 

Não é possível extirpar nosso lado egoísta, mas podemos e devemos desenvolver o nosso lado altruísta. E será com este lado com o qual o homem aprenderá a dar mais valor ao seu semelhante e, o mais importante, agirá em benefício deste. Não quero dizer em substituição das religiões: temos um lado de acreditar em algo superior e mais de 90% da população mundial possui alguma crença. 

Já a ciência e a tecnologia, em dois ou três séculos, aumentaram e muito a vida média das pessoas, colocaram o ser humano em uma época de maior conforto de sua história e irão reparar os danos oriundos desse avanço. Isso é o ser humano se voltando ao próprio ser humano. E neste ponto entra a Educação em geral! 

Imaginem novos materiais a construírem moradias mais baratas, alimentos nutritivos e acessíveis à população de baixa renda, mais trabalho, assistência médica, etc. 
Se com o egoísmo nada disso valeria, a prática do altruísmo pode levar o ser humano a um patamar em qualidade de vida nunca imaginada por ninguém. Só religiões não bastam! 

  
Nota: 

A salvação espiritual pregada pelo cristianismo e todas as outras religiões prometem e conseguem melhoras em pessoas de seus estados emocionais negativos.  E poderão assim ter uma melhora na qualidade de vida conseguindo estabilidade financeira e melhores níveis de vida em conforto, bem-estar e saúde. Mas a neurociência está provando que a prática das religiões envolve áreas cerebrais responsáveis pela ansiedade, angústia, depressão, etc. Na verdade, então é uma melhora psicológica. Psiquiatria, psicologia e a neurociência, entre as suas ramificações, poderão substituir e/ou ajudar qualquer prática religiosa para os males do cérebro. Mais uma vez é o ser humano se voltando ao próprio ser humano.