Escrito em: 12/12/2008.
Atualizado em: 27/09/2018.
Palavras-chave: religião, relativismo religioso, cristianismo, hinduísmo, xintoísmo, paradoxo.
A ideia deste artigo havia faz tempo, mas um fato corroborou com a minha iniciativa em escrevê-lo: até pessoas com nível educacional superior podem
se enganar a respeito de como os dogmas ou os ensinamentos das
religiões, elas próprias, se processam em suas mentes. O fato foi a
frase "é genético", como se você, por ter sido filho de pais católicos,
por exemplo, nascera católico, mesmo sem saber muitos detalhes dessa
religião.
Esse assunto surgiu entre amigos os quais a maioria deles, estávamos em oito, não sabia de onde vieram as
suas crenças, suas verdades religiosas, seus valores religiosos e
aqueles secundários, terciários, ou mais, oriundos dos primeiros.
Mas,
nascemos já com a religião dos nossos pais, do nosso meio social, o
nosso meio ambiente social, de amigos e mesmo de pessoas desconhecidas,
às vezes nos falando sobre assuntos pertinentes a ela? A resposta é:
claro que não!
Uma
criança indiana de seis anos de idade acaba de aprender o nome dos três
deuses criadores e destruidores do universo, Brahma, Vishnu e Shiva.
Ela não registrará essa informação em seus genes e sim na memória. Não
irá passar para seus descendentes essa informação só se... Ensinar a
elas! E aqui está o ponto de máxima deste artigo: a educação e a
formação de valores religiosos baseados
em condições culturais são a base a levar as pessoas a formar suas
ideias, verdades, dúvidas, crenças, etc., a respeito de suas religiões.
Uma criança católica aprendendo aos sete anos o valor da
sua presença em uma missa, da igreja de seu bairro, transmitirá essa
informação com seus sentimentos aos filhos de maneira genética? Não!
Terá que ensinar-lhes!
Podemos pensar em uma experiência, embora nunca a colocaríamos
em prática devido às questões humanas e éticas, morais e legais nela
implicadas: dois gêmeos são separados ao nascerem. Um é levado a um país
muçulmano e outro ficaria no Brasil. Seriam criados por famílias
diferentes, em contextos sociais diferentes. Após uns trinta anos se
encontrariam.
Sem
realizar essa experiência, sabemos do possível resultado de um
estranhar a religião do outro. O brasileiro concorda com a relação de
Pai e Filho entre Deus e Cristo e este veio ao mundo para nos salvar. A
Bíblia é o seu livro sagrado no qual existem ensinamentos dos Dois. O
muçulmano dirá sobre Cristo - e aqui já começa a briga – como um profeta
em nível terreno e humano. Maomé é o verdadeiro messias, quem escreveu
um livro sobre tudo da vontade do deus Alá para o povo na Terra. O livro
é o Corão e nem queira o brasileiro dizer a ele do quão errado é esse
livro sobre a nossa realidade nesse mundo!
Quem está certo? Cada um se achará certo. E quem muda este estado de coisas? Ninguém!
Os gêmeos não se entenderiam, poderiam se respeitar pois são irmãos,
etc. Muitas são as situações possíveis decorrentes de uma história assim, mas um fato é verdadeiro: mudar as crenças tanto de um como as do outro seria quase impossível. Digo “quase”
porque um cristão pode se converter em muçulmano e vice-versa, mas
vemos por aí uma indiferença quase total de pessoas religiosas quanto às
crenças de outra religião.
Lembrando da
minha infância, logo quando comecei a tomar consciência do mundo,
depois dos quatro anos, vejo em memória eu e meus pais entrando na
principal igreja católica da cidade. Eu admirava aqueles santos nas
paredes e minha mãe dizia algo sobre a história deles, simplificadamente
claro, pois eu era uma criança. Aquele lugar foi o ambiente mais bonito
conhecido por mim até então e aprendi da importância daquele tipo de
local para louvor e adoração a Jesus Cristo e Deus.
Lembro
das festas natalinas. Qual criança não gosta de presentes? Qual criança
não gosta das comidas típicas dessas datas? Mas aprendia sobre o dia
vinte e cinco de dezembro como o dia do nascimento de Cristo. O mesmo
Cristo relacionado com os santos da igreja em histórias contadas pelos mais velhos.
Mas
a minha vida naquela época, como a vida de todos os meus amigos não era
só de Natal e igreja. Pais de amigos contando sobre a criação divina,
amigos com mais idade
dizendo de particularidades da Bíblia, mesmo incompletas ou um pouco
distorcidas, pois eram crianças também, sujeitas a erros. Professores,
os amigos da escola, as pessoas nas ruas, todos se referindo a um
contexto complexo e absoluto a me informar, educar, ensinar e a
respeitar os fatos do cristianismo.
Meu
cérebro, como o de todas as crianças, estavam em desenvolvimento. Isso
era: de uma massa bruta, não lapidada, o nosso meio ambiente social influía decisivamente na formação do nosso caráter, da nossa personalidade e dos nossos valores religiosos, alguns já citados no começo deste texto, todos influenciados pelo cristianismo de forma direta e absolutamente inquestionável.
Não
eram somente as histórias, ensinamentos e fatos das vidas daquelas
pessoas maravilhosas ilustradas em revistas, livros, na igreja ou se
falando delas em conversas das pessoas sobre a nossa religião a nos
educar. Nossos valores, nossas concepções de como é este mundo, o certo e
o errado provenientes das interpretações do nosso Livro Sagrado, a
Bíblia, eram influências a moldarem nossas cabeças. "Não roubarás”, “Não
matarás"...
Não serão todas essas influências uma forte carga emocional para nós,
desde as primeiras idades, a marcarem nossas vidas e condutas perante às
pessoas e a nossa sociedade? Não há dúvidas sobre isso.
Tenho
conversado com muitas pessoas religiosas sobre esse tema. Pessoas
assíduas praticantes de suas religiões. O católico frequentando suas
missas, rezando, orando, louvando os seus santos.
O evangélico sempre presente em cultos, contribuindo com o dízimo para
com a sua igreja, lendo e/ou estudando o Novo Testamento, hinduístas e
budistas praticando os seus mantras, etc.
Posso
dizer algo importante e surpreendente sobre essas conversas: todos sem
exceção admitem as "verdades" de suas crenças como absolutas, suas
religiões como as corretas, desprezando, ficando indiferente quando digo
das "verdades" das outras. Chegam essas conversas a serem motivos de
discussões acaloradas quando eu teimo em dizer da relatividade das
religiões, tema este sempre abordado por mim em meus artigos em vários
blogs. Digo neles do desprezo de cada pessoa com as crenças das outras.
Isto mostra claramente o relativismo entre elas. Suas "verdades" são
relativas, dependem de onde cresceram, a cultura local, religião local,
etc. Leia o meu artigo "O relativismo das religiões e o que existe por
trás disto", (1). O absoluto é a capacidade do ser humano em crer,
sentir algo sobrenatural, ou ter fé somente em si mesmo, como é o caso
dos ateus. Esta capacidade, e acredito nisto, veio da evolução sobre os
seres humanos e se tornou uma vantagem para a perpetuação da espécie no planeta como está no artigo mencionado.
Em
experiências com budistas e freiras franciscanas, eles em meditação e
elas rezando, dois cientistas da Universidade da Pensilvânia, EUA, o neurocientista Andrew Newberg e o psiquiatra Eugene D'Aquili,
perceberam uma diminuição da atividade neuronal na parte de trás dos
crânios daquelas pessoas, no lobo parietal superior. É a região do
cérebro onde temos o senso de orientação no espaço e no tempo e também
da diferenciação entre indivíduo e os demais seres e objetos. Privados
dessa atividade neuronal, os budistas e as freiras sentiram uma perda da
divisão de seus seres com as coisas desse mundo, ou seja, tiveram um
sentimento de unicidade com o universo. É o mesmo sentimento de
iluminação religiosa, êxtase, a perda do "eu" ao se misturar com o mundo
ao redor.
Veja, essa porção do cérebro funciona assim
devido a sua estrutura determinada por genes, independente das crenças
de cada um. As freiras rezavam com motivos cristãos e os budistas com o aprendido em suas vidas bem diferentes daquelas
das freiras. E ambos os grupos chegaram à mesma situação, ou estado. Os
antecedentes, ou pais, das freiras e dos budistas, passaram seus genes
aos filhos e foram construídas regiões cerebrais "brutas", iguais em
seus cérebros, a serem lapidadas diferentemente pela educação,
ensinamentos, crenças e a cultura de onde vieram. Eles nasceram com tudo
o que acreditam em seus cérebros? A resposta é não! Isto poderia ser provado? Bastaria não os ensinar sobre as suas religiões, mas quem faria isto? Ninguém, mas podemos imaginar sem erro da veracidade dessa proposição.
Vejo pessoas doutrinadas
desde crianças nos ensinamentos religiosos de seus meios sociais. E
blasfêmia fora um ótimo termo para manter todo mundo ligado a eles. Até
pode ter surgido com outras finalidades, mas o termo é feio, fere as
convicções de cada um, ofende, é ligado a preconceito, etc. Todos
possuem medo dela.
Chamei
este artigo de "O paradoxo dos gêmeos religiosos" porque, para quem não
consegue mudar seu referencial, se desprendendo de tudo ensinado a ela em termos de, não só educação religiosa, mas, de informações e conceitos da religião local, do próprio contexto social, se colocando no lugar das pessoas de outras religiões, não irá entender nada aqui escrito. Poderá pensar em ser um paradoxo este texto, não saberá explicar as ideias apresentadas aqui. E na realidade não existe paradoxo nenhum. Confusão nenhuma. Existe para os que acham a religiões deles absolutas, corretas em relação as outras, e estas, apenas invenções de outros povos. E não é, e sim o acreditar e a fé são absolutos, reais a todas as pessoas. São inerentes à natureza dos homens e mulheres.
O sociobiólogo
Edward Wilson disse, em seu livro “Da Natureza Humana”, (2) que o ser
humano criou mais de 60.000 seitas e religiões devido ao nosso medo da
morte e do após a morte. Outras razões também mexiam e mexem conosco
como o fato de se querer explicar a origem de tudo, da natureza, de nós
mesmos, de como lidarmos com o bem e o mal, o porquê das suas
existências, etc. Nós seres humanos sempre tivemos a capacidade para
acreditar em algo e passamos aos nossos descendentes no planeta inteiro
em diferentes épocas. Por isso a existência de tantas crenças diferentes
até hoje e citei apenas poucos aspectos de três delas neste artigo para
o entendimento do leitor. Nenhuma delas é absoluta. No xintoísmo japonês,
a mais praticada no Japão, por exemplo, o mundo foi criado a partir de pingos d'água produzidos
através de uma lança atirada ao mar por um casal de deuses. Esses pingos
se transformaram em ilhas. Na época do surgimento dessa crença, os
japoneses, seus ancestrais, não conheciam os continentes, nem sabiam de
um planeta esférico repleto de outras ilhas e continentes.
Eles procuraram uma resposta com relação às misteriosas paisagens no
horizonte: mar e algumas ilhas. Veja o meu artigo "O surgimento de uma
religião como uma necessidade humana". (3)
Enfim, as religiões buscaram respostas para grandes mistérios perpetuados na mente dos seres humanos, mas, esses mistérios acabaram sendo explicados nas mais variadas formas, tornando o conhecimento, ainda sem a ciência tradicional, uma verdadeira torre
de babel. A ciência sim busca respostas satisfatórias porque não lida
com a emoção, a fé, o acreditar, e sim com a razão. E aí busca
respostas "únicas".
Uma
religião pode "explicar" o surgimento do universo da sua maneira,
absoluta para os seus seguidores. Mas outra explica de modo diferente...
Absoluta também para os seus fiéis... Qual estará correta? Digo: explicações assim não são do campo dos sentimentos e emoções e, por isto, é dever das ciências, e só delas.
Referências:
1 – Argos Arruda Pinto. O relativismo religioso e o que existe por trás disto. 2007. Disponível em: < http://orelativismodasreligioes.blogspot.com/2007/03/o-relativismo-das-religies-e-o-que.html >. Acesso em: 27/09/2018.
2 – WILSON, E. Da Natureza Humana. 1. ed. São Paulo: Editora EDUSP, 1981.
3 – Argos Arruda Pinto. O surgimento de uma religião como uma necessidade humana. 2008. Disponível em: < http://orelativismodasreligioes.blogspot.com/2008/01/o-surgimento-de-uma-religio-como-uma_11.html >. Acesso em: 27/09/2018.
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