domingo, 19 de setembro de 2021

Neurociência, Evolução, o acreditar e a fé e as religiões

Todos sabem que as práticas religiosas fazem bem às pessoas. São muitos os testemunhos, comentários, conversas de parentes, amigos, pessoas em geral, por experiência própria, etc., os quais sempre possuem algo de positivo a dizer sobre tais práticas e seus resultados.

Talvez você não seja religioso, mas não importa, mesmo se achar que essas práticas não lhe servem, conhece a importância delas na vida de muita gente. E se for religioso irá procurar no sobrenatural esperanças, alívio de sintomas emocionais negativos, paz interior, ou seja, uma enorme gama de resultados positivos e benéficos a sua vida. 

Seja qual for a religião, as práticas religiosas relacionadas aos valores religiosos dela mesma serão benéficas aos seus adeptos. E como se sabe disto? Com apenas um argumento será suficiente: ninguém vê uma fuga em massa de adeptos de uma religião, em números expressivos em relação ao total dessa religião. Por exemplo, nós não vemos no Cristianismo, o maior do planeta, com aproximadamente 2,4 bilhões de adeptos, ter milhões ou, melhor dizendo, dezenas, centenas de milhões de pessoas mudando para outra religião em poucos meses, que seja. Conhecemos pessoas trocando de religião, mas é um número muito pequeno em comparação ao total de seguidores. A fuga a qual me refiro denotaria insatisfação, decepção, e o principal: algum problema sério a respeito dos valores religiosos dessa imensa religião. Na realidade isso beira a um delírio porque ele não cresceria tanto se não fosse tão benéfico. Nenhuma outra religião com muitos seguidores também. E mesmo as menores, salvo exceções. 

As religiões promovem um melhor entrosamento entre as pessoas de um grupo, pequeno ou não, e muitos cientistas publicam há muito tempo sobre elas, e não só a uma, influenciando na sobrevivência de grupos humanos no planeta em todas as épocas. Fatos a ver com a sobrevivência individual e também de integrantes dos grupos humanos. A Evolução também chegando ao social pela via religiosa!

Eles dizem sobre fatos óbvios mas que são de grande importância aqui, para depois eu levantar questões de também importância na Neurociência. Cito três deles:

1 - "A religião em geral tem efeitos positivos na saúde física e mental ... as religiões tendem a ser pró-natalistas e mais pessoas religiosas tendem a deixar mais descendentes do que pessoas menos religiosas ou não religiosas ... o grande mundo de religiões que evoluíram no primeiro milênio a.C. durante um período de grande caos social e perturbação, enfatizou um Deus onipotente e transcendente de amor e misericórdia, que ofereceu a salvação em uma vida pós celestial e indivíduos libertados do sofrimento terreno ...". (1)

2 - "A religiosidade é um universal humano, que oferece respostas às questões de contingências [ Natureza do que acontece de modo eventual, incidental ou desnecessário, podendo ter ocorrido de outra forma ou não se ter efetivado] A religiosidade, portanto, pode ser dividida em duas questões: a saber, as questões levantadas como resultado da experiência com as contingências e, em segundo lugar, a resposta a essas questões através da ideia de transcendência ... Uma dissonância cognitiva entre a compreensão de si mesmo e do mundo é vivenciada como uma contingência. A contingência pressupõe que os humanos não considerem mais a realidade garantida. Uma vez que os humanos experimentaram eventos surpreendentes, não rotineiros e inesperados, e uma vez que sentimentos de medo e esperança emergem e possivelmente começa a busca por uma âncora para o evento contingente no conhecido mundo consistente, isso pode sinalizar religiosidade ... Existem inúmeras respostas possíveis para as questões levantadas por experiências de eventos contingentes." (2)

3 - "Pensamentos religiosos ... reduzem as taxas de crimes e aumentam o comportamento altruísta entre estranhos anônimos", dizem os professores de Psicologia Ara Norenzayan e Azim F. Shariff da "University of British Columbia" do Canadá na revista "'Science'". (3) 

Com toda a população de crentes no mundo inteiro, mesmo com aqueles praticantes não assíduos no que acreditam, o número de ateus é significamente menor que todos os habitantes do planeta. Digo isto para entrarmos no conceito genérico de "acreditar". Ele não compreende apenas os valores religiosos. Você acredita no seu potencial a exercer um novo cargo em seu trabalho. Que irá se recuperar logo de uma doença e voltar a sua vida normal. Ele é geral e inato ao ser humano. Nascemos com ele; está em nossas mentes e quase nem refletimos sobre essa condição muito forte de nossa natureza. Se alguém diz não acreditar em nada, já pensamos nos valores religiosos ou mitos dos mais estranhos possíveis; ele é ateu mas acredita em si próprio, no próprio potencial para viver uma vida saudável e feliz, nos mostrando como o conceito de acreditar é geral, forte.

Quanto às questões religiosas, primeiro se acredita nos valores para depois se exercer a fé. Se coloca fé naquilo no que se acredita e não necessariamente só nos valores religiosos, mas também em si próprio como no caso do "acreditar" do ateu, sendo outro alicerce em nossas vidas mentais. 

O acreditar e a fé estão ligados à esperança, aos nossos sonhos, sentimentos e emoções. Não é possível conceber uma pessoa sem a capacidade de "acreditar" e digo assim de modo geral e não só para alguém não acreditando na religiosidade. Eles estão dentro dos nossos cérebros e não é possível extirpá-los de nós, não os termos, a não ser, possivelmente, em casos patológicos. 

Nas profundezas dos nossos cérebros, precisamente em circuitos neuronais com suas reverberações, simplificando o raciocínio, o "conceito" de Deus está presente junto a sentimentos, emoções, ideias de como Ele é, onipresente, onipotente e onisciente, pela imaginação de um crente Nele, etc. Mas... Esses mesmos circuitos estão configurados no cérebro de um hinduísta mas de modo diferente porque, senão, o hindu acreditaria e teria o mesmo "conceito" do Deus cristão! Cristãos e hinduístas foram ensinados diferentemente pelos pais, nos seus meios ambientes sociais porque essas duas religiões são diferentes, e, por conseguinte, acreditam e colocam fé em valores religiosos diferentes. Então seria impossível haver ao mesmo tempo deuses diferentes e valores diferentes também. E as outras religiões e também outras que já se extinguiram? Sim, e a saída a esse impasse seria admitir a veracidade de uma só. Mas então voltaríamos à pergunta: por que todas são benéficas aos próprios adeptos? Em minha opinião, e é aquilo sempre escrito por mim, os valores estão fortemente arraigados nos cérebros de cada adepto de todas as religiões, possuindo muita força quando evocados em orações, pensamentos, rituais, etc., não existindo, na realidade, entes divinos e todos os valores relacionados a eles. O fato é somente cerebral, a energia do cérebro desprendida e não oriunda do sobrenatural e sim na concentração no que se acredita e põe fé!

Seria o conceito filosófico da Navalha de Occan válido aos meus argumentos? Ela que diz ser a resposta mais simples ser a verdadeira? Pois bem, de todas as épocas, a "criação" de milhões de deuses e dezenas ou centenas de milhões de outros valores religiosos, sem exageros, não poderiam ser substituídos por apenas um "conceito"? O cérebro humano? Deixo esta questão em aberto. 

Acredito em um futuro de muitas discussões entre as religiões e a Neurociência, conforme esta for pesquisando e descobrindo sobre o que há nas "profundezas cerebrais" do segundo parágrafo anterior.

E, conforme o argumento: "A religiosidade contribuiu com a nossa sobrevivência como espécie humana citados nos exemplos de um a três", eu pergunto: existiriam religiões, crenças e sistemas de crenças se não fossem o acreditar e a fé? Lógico que não! Eles seriam vantagens evolutivas? Na minha opinião sim e, antes que eu começasse a ler artigos similares aos citados, escrevi um texto de nome "O acreditar e a fé como vantagens evolutivas", (2.a) mas relativo a problemas existenciais oriundos de questionamentos da nossa inteligência e consciência. Esses problemas levariam a outros de ordem emocional, comprometendo a nossa sobrevivência, algo como no item dois. Um tema em nível individual mas certamente causando problemas aos grupos sociais.

O acreditar e a fé realmente produzem comportamentos benéficos aos próprios religiosos e às suas relações dentro de um grupo. Como exemplo, uma pessoa rezando "O Pai Nosso" está exercendo a fé em Deus pois acredita Nele, e ainda existe o compromisso social na frase "perdoai as nossas ofensas, assim como perdoamos a quem nos tenham ofendido", sendo o perdão um ato de grande benefício entre pessoas. Assim, rezando em casa, na igreja ou no templo frequentado, é um comportamento, ritualístico. 

E se alguém disser que houve muitas mortes devido às religiões através de homicídios, atentados, conflitos, guerras, etc., digo da ignorância, intolerância, incompreensão, contra às quais não podemos fazer quase nada, apenas lutar contra. De qualquer maneira, em 1850 éramos por volta de 1,7 bilhões de pessoas no mundo. E hoje, a despeito de todas as guerras, catástrofes naturais, homicídios, doenças, etc., de lá para cá, somos mais de 7,5 bilhões. 

As forças evolutivas estão vencendo.

Somos mais eficientes do que ratos!

 

 Notas:

(1) Sanderson, S. K. (2008). Adaptation, evolution, and religion.

https://www.researchgate.net/.../228344844_Adaptation....

(2) Soeling, C. & Voland, E. (2002). Toward an evolutionary psychology of religiosity.

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12496740.

(2.a) Pinto, A. A. (2008). O acreditar e a fé como vantagens evolutivas.

https://orelativismodasreligioes.blogspot.com/.../o-acred....

(3) Shariff, A. F. & Norenzayan, A. (2008). The Origin and Evolution of Religious Prosociality.

https://www.science.org/doi/abs/10.1126/science.1158757....